17 de mai. de 2017

Invocação






Essa noite eu desci
seu colo, quente
- na verdade
escorreguei -
suas mãos macias,
leves...

escuro em volta
(a luz estava em nós)

Meu peito em você
te sentindo quente,
eu estava grudado
e rodávamos
ventando suavemente..

estávamos em uma nuvem qualquer..
dançávamos voando
mergulhados na escuridão

frio lá fora
e você com o calor dos anjos

Guarda,
não quero alma!
Boca língua palma
Preciso te ver!

Guarda essa alma!
Ela já me encantou...

Guarda essa calma!
Esconde esse pejo!

Obedece!
Boca língua palma...

Não me pede calma!
Deixa-me te levar,
raptar surrupiar trancar

Acredita.
Eu não minto.

Cumpre essas promessas
remetidas, arremetidas
por essa boca

Vem. Acredita.
Eu não minto.

Guarda essa alma,
dispa-se sem pressa

Guarda essa alma,
peito perna boca língua

Alma? Que alma?

Por favor, não fala!
Tua voz me perde...
Não me confunde Inferno!

Vem me ver sem alma
sem calma, obedece!

(imagem Lovers #34 por Thomas J.Vilot)

Alquimia



Decantei
em longos,
sinuosos versos,
o veneno das tuas presas


Encorujei meu espírito
protegendo-me
das setas
e elas continuam
a procurar meu peito.


Rezou pra eu te esquecer?
Foi em vão...

Sigo zonza, insone,
vagueio pela cidade
envenenada e louca...

sinos




Pelos mortos?
Pelos vivos?


Os sinos dobram por quem?
Perdidos na imensidão....


Não clamam por mim
Sinos de cristal...


Sinos de bronze
Sinos de luar...


Perdidos...
Perdidos...

... perdida

AVESSO





Meu corpo é teu
Moro no abismo
Imersa em teu olhar

Meu desejo é teu
E alimenta essa voragem
Teu olhar me consome

Sigo desequilibrada
Sem norte
Sem rumo

Teus olhos
Teu desejo
Teu corpo

Sobra a alma essa desconhecida
Que se esconde no sorvedouro
Dos teus cataclismos

Naufragada




Minha cabeça roda
Entorpecida
Naufragada na escuridão
Afundando-se cada vez mais
No temor e angustia

Meus olhos nus
Vagueiam tontos
A espera de uma luz
Querendo fugir
Ou apenas gritar

Minha voz embargada
Agarra-se à garganta
Sem forças
Sufocando o grito
Hipnotizando a inquietação
Matando a esperança

Depois vou dormir,
depois vou acordar,
depois vou trabalhar

e depois vou voltar.

Olhar Futuro




Sol Azul
Céu dourado
Mar translucidamente púrpura

Tudo em seu lugar
Vago até seus olhos futuros

...em algum lugar
você me vê...
ou talvez me pressinta.

Pendurado numa estrela
quase me toca.

impreciso



Tantos desejos
Tantos sonhos

Preciso não cansar

Sonhos fugidios
Imagens de cometas

Preciso não sonhar

Tantas ideias
Tantas contradições

Preciso não pensar

Tantas imagens
Inquietas e doces

Preciso não preci
sar

No silêncio dos olhos



Em que língua se diz, em que nação,
Em que outra humanidade se aprendeu
A palavra que ordene a confusão
Que neste remoinho se teceu?
Que murmúrio de vento, que dourados
Cantos de ave pousada em altos ramos
Dirão, em som, as coisas que, calados,
No silêncio dos olhos confessamos?

in Os Poemas Possíveis, José Saramago

INNAMORATO




innamorato

Delícia
Teus abraços
Mão que desliza


Fácil
Pela
Pele
Suave
Doce
Voluptuosa


Como sonhei
Imaginei,
Desenhei
Desejei
Cansei


Chega de códigos html
Amo tua voz de anjo


Meu sorriso bobo


Revela
Conta
Mostra


Teu corpo
Brilhante encanto

Acalanto




Queria te escrever um longo poema
Quem sabe achasse as rimas certas
Contasse as sílabas métricas
Apenas pra te dizer desse amor imenso


As palavras viriam prontas
Desceriam como cascata
De um rio de solidão e medo


Não importa
Danem-se as rimas
Danem-se as sílabas métricas


Dorme
Meu menino
Meu encanto
Eu te cubro
Eu te aqueço


Nada de tempestades hoje
Nada de fúria
Toma um beijo
Cálido e terno
Dorme que eu te velo.


*IMAGEM:painting by Gogalniceanu Carolina

janelas




Pelo minúsculo quadrado

vejo a imensidão

uma nesga de luar

ilumina o lugar

um sopro de alegria

volteia e prende minha atenção

por um instante

um momento apenas

que depressa se perde

irreal e fugidio

como as promessas





*The_Window_by_jerry8448

poema invisível




palavras tecem
sem pressa
 rede tênue
em que esqueces

palavras invisíveis
trançadas em tramas débeis

poemas puros
que jamais li
escreverei
ou escrevi

versos emaranhados
e confusos
que se prendem ao fuso

hieróglifos tardios
poema invisível
que adivinho

CINZA



TARDE CINZENTA
MANHÃ CINZENTA
NOITE CINZENTA
TODO UM DIA

COMPLETAMENTE 
CINZA
CINZENTAMENTE TRISTE

MAS EM MINHA ALMA
EM ALGUM LUGAR


INEXPLICÁVEL

SURGE A LUZ

E A ESCURIDÃO TRANSFORMA- SE
TORNA-SE UM SUAVE E TRISTE CINZA.


15 de mai. de 2017

fantasmas











O vento rodopia nas frinchas
E anima antigos sussurros

Não há corvos na janela
Nem lareiras

Não há pedras encasteladas
Nenhuma Joana pelos cantos

Não há borboletas
Apenas o pó que volteja
Encandeado pelo lume
Da folha morta

Ninguém vê meus fantasmas

E eles dançam primorosos
com delicadeza e distinção

Rodopiam tarde da noite
Cheios de graça
Roubam-me o ar

Tardios
Mortos
Castiços

(Rosa Cardoso)