31 de dez. de 2010

Cinderela Adormecida Com Filtro Solar Fator Zero/ Poema de Eduardo Perrone


Antes da meia noite
Ela gira sobre os calcanhares,
E retorna à face que lhe cabia
Segundo diziam
As Escrituras.
A face pura, hoje sem o adorno que lhe perfurava,
Era moldura perfeita
-e ela evitava-
Dizendo desconhecer
O que sempre soube...


Então... Moça linda dos cabelos de fel,
Onde há céu que caiba teu corpo desnudo...?
Esse pano cítrico arregaça o cínico,
Que tenta fingir
Te olhar e não te ver...
Talvez seja a tal atitude,
Essa coisa abstrata , e que quase sempre ilude,
Quem teime ( ou ouse) se afastar de você...
Sabe , poder eu até pude.
Mas preferi tentar entender.


Entender...de onde existem tantas lembranças,
Se, nestas andanças,
Não nos lambuzamos da nossa saliva!
Se foi encantamento, que não morra, então,
Essa coisa viva
Que escorre entre a pele, e o que dela revele.
Pois as marcas que levamos de tudo aquilo,
Não se mede em metros, segundos ou quilo...
Foi saga, foi poesia, que a cada um arrepia,
Quando longe, tudo parece tão perto.


É o errado, moça.
Travestido de certo.


*Estava procurando uma imagem pra usar com o poema do Edu e esbarrei com essa tela  de Julie Heffernan. Gostei das telas da moça e acho que o edu não se importa com minha escolha de imagens...então:
 - Self Portrait as Wunder Kabinet 2003, oil on canvas, 82 x 58 inches




28 de dez. de 2010

romanesco


ontem tua imagem me distraiu
assombrava os porta-retratos
fotografias de beijos perdidos


não era a boca
nem teu beijo
não me lembro do gosto
nem da cor que têm


era a idéia do sorriso
bendito sorriso
vagando pelo meu quarto
quicando pelos cantos
feito ídolo errante ou errado
não sei bem


comprei fita
colei os cacos
dias e dias


prendi tua alma
preguei na parede
pra te esquecer


vejo o beijo guardado
minha boca se esgarça
vejo a foto e te destruo
a foto desfolha graça
e eu rio


distraidamente


destroço teu sorriso
suavemente aceito tua proposta
e desfaço teu retrato
iconoclasta e romanesco

Rosa Cardoso

12 de dez. de 2010

Desculpe-me Rosalie Anderson! (Para Rosa Cardoso)

¨

Sentia-me ansioso ao aguardá-la ali entre cotovelos de algumas dezenas de pessoas. Era chegado o dia de conhecer uma das minhas poetisas prediletas que estava vindo à São Paulo unicamente para conhecer seus amigos escritores.
Aliás, o meu estado ia além da ansiedade já que ardia em meu peito uma alegria quase juvenil que fez-me revoar e regredir aos meus 14 anos. Resguardadas as devidas proporções, era como se me devolvessem o tempo e a admiração quase santa que nutria pela professora de francês no meu 4º ano ginasial. “Saviez-vous que je vous aime, ma chère?” - ela costumava dizer-me à saída das aulas, sempre aos beicinhos e de uma meneira que eu gostava de supor provocante.
Talvez os seus olhos amendoados e o belo par de pernas por debaixo de suas saias sempre justas, aliados ao meio palma acima do joelho me causassem certo pânico. No fim das contas um “oui” era a única resposta que eu lhe tinha antes de ganhar a balburdia dos corredores. – Deuses jamais estariam sujeitos à profanações - Era a resposta que me dava para cada de suas insinuações, brincadeiras ou não. Lógico que conspirava contra mim o respeito que por sentia pela dona Catarina, principalmente diante do fato dela ter sido minha professora desde o 1º ano daquela série.

Contudo tal referência pouco ou nada tinha a ver com a poetisa que eu aguardava. Todavia a mesma excitação que me causara aquela frase em francês me acompanhava ao esperá-la na ala de desembarque do Aeroporto Internacional de Congonhas. Conforme o combinado eu não me esquecera nem mesmo da placa com o indicativo “Véio China” para lhe facilitar o reconhecimento.
Repentinamente o saguão é tomado por outras dezenas de pessoas que portavam em mãos máquinas de fotografar e filmadoras profissionais. “Nossa! O que poderá ser?” questiono-me ao ver aquele bando se infiltrando entre nós, deixando-nos ainda mais espremidos uns aos outros. Um pouco mais de correria generalizada e os “clicks” das suas máquinas podiam ser ouvidos à centenas.

Os flashes espocavam como se querendo iluminar aquele início de noite de um calor modorrento. Repentinamente ela surge no saguão interno, linda, glamurosa, espetacular. Uau! Era para ela todo aquele aparato?
Evidente! La estavam os paparazzi à sua caça.


E isso me deixou feliz. Contente ao presenciar o fato que sua poesia havia galgado os horizontes impostos àqueles que pretendam se tornar celebridades. Galgado degraus que nem mesmo eu sabia vencidos. Todavia sentía-me incomodado; E se perguntassem a ela quem era aquele o senhor de barba branca e óculos negros com um “Veio China” escrito em letras irregulares num folha de papel cartolina? Eu me pressentia tão insignificante diante daquele aparato que retornei à mesma conclusão dos tempos de ginásio – Deuses jamais estarão....... – Murmurei a antiga cantilena e abaixei o cartaz – Talvez ela nem tivesse me percebido ali –
Porém ela me percebera sim! Tanto que veio sorridente ao meu encontro.

-Nice to meet you. You seemed very nice! – Ela disse à queima roupa – Permaneci estático. Mas por que estaria falando o inglês – Ensimesmei.

Eu não sabia o que se passava por debaixo daqueles cabelos sedosos e de um perfume delicioso. Esnobismo, talvez? Não! Impossível! Jamais lhe percebera tal ranço. Em todo o caso eu não podia ser-lhe indelicado, então lhe respondi num sorriso tímido:

-Sim! Você também é tão ou mais simpática e bonita que em suas fotos de Orkut -

-What? Orkut? what has this to do? – Ela rebateu.

Eu não entendia exatamente o porquê daquilo. Ainda mais que os paparazzi avançam e uma nova sessão de fotos se iniciava. Eles berravam, urravam, gemiam:

-Please, Andie MacDowell, join the old man! Please! – Rogavam num inglês que se pretendia ser perfeito.

-Andie MacDowell? Jesus Cristo, ela é a Andie MacDowell? - Balbucio estarrecido. Então tudo me fez sentido ao relembrar suas fisionomias e os traços dos rostos e sorrisos. - Como eram parecidas! – Concluí abismado.
  E surpreso eu sentia os cotovelos dos paparazzi nas minhas costas e aquilo me incomodava. Eles que fossem à puta que pariu! Malditos paparazzi! Eu não precisava daquela corja pedindo para a senhora MacDowell que posasse ao meu lado, ou melhor; ao lado de um velho decrépito– “Abutres sensacionalistas! Quanta falta de respeito!” – Indignei-me e regurgitei para eles.

Contudo o surrealismo daquilo me faz olhar à volta e perceber o enorme equívoco que eu cometera:

Eu tinha ido parar no setor de desembarque dos vôos internacionais, quando de fato deveria estar na ala dos nacionais. Olho para o relógio – “Meu Deus! Numa hora dessa ela deve ter desembarcado” Disse-me apreensivo

-What? – Novamente questiona lady MacDowell sem entender o que eu falara para aqueles idiotas.

Eu tentava me desvencilhar dela e da multidão enquanto lady MacDowell insistia nos olhares sem que eu entendesse os seus motivos; parecia que ela se afeiçoara à mim. Talvez a minha feição lhe fizesse lembrar o pai, o tio, o avô, ou mesmo algum velho amante dos seus autoflagelos, coisa muito comum entre os artistas carismáticos. Em todo caso eu não tinha tempo para poder descobrir. Olhei para Andie, pego em suas faces e lhes faço mimos enquanto lhe dou o meu melhor sorriso de agradecimento.
Em seguida estico o pescoço e dou um terno beijo-lhe na testa. Ela aceita comovida e fecha os olhos como se fosse aquilo fosse uma espécie de um cerimonial na entrega do Oscar. Antes de ir estaciono em seus expressivos olhos castanhos esverdeados e procuro esmerar no meu sofrível inglês:

- Andie! His eyes are wonderful. And you're a talented actress and success. However, there is poetry in his eyes - Falo mansamente para que me compreenda sem enganos.

Ainda ouço-lhe um outro dos seus “what” enquanto sigo em disparada para o setor de desembarque nacional. Eu estava atrasado com o meu encontro com a poesia.
Eu não mentira para Andie. Havia enorme beleza em seus olhos, no olhar da atriz de sucesso. Contudo, não havia poesia neles.
  E ainda mais porque não haveria MacDowell que me detivesse no prazer de encontrar uma de minhas poetisas favoritas. E como estava mais que atrasado, corri ainda mais. Esbaforido e em bicas de suor chego aonde deveria estar desde o princípio. 
Olho para os meus pés que latejam dentro do tênis e percebo em minha mão a placa com o meu nome adormecida na altura do joelho. Encho-me de bravura e levanto o cartaz enquanto procuro a pessoa com o olhar. Súbito, por trás de mim sinto um toque no meu ombro esquerdo. Viro incontinenti.

-Velhinho safado! Eu já tinha te visto! Nem precisei da placa! Reconheci pela barba e os óculos escuros! – Ela exclama divertida. Cansado do jeito que estava só consegui responder um “Pois é” Porém ela queria falar, demonstrar felicidade de estar ali e o seu ótimo senso de humor:

-Aposto que se eu fosse a Andie MacDowell você já estaria me esperando na 1ª fila há mais de meio século! – Sussurra a sorridente Rosa Cardoso com a voz bem próxima ao meu ouvido. Nós sempre brincáramos com aquela coisa dela se parecer com Andie MacDowell. Porém ela não sabia da missa um terço!

Então eu apenas ri. À princípio, discreto, divertido. Depois, espalhafatoso e em largas gargalhadas. Surpreso, as pessoas que passavam permaneciam nos olhando, aliás, mais à mim que a ela.
E Rosa Cardoso apenas continuava sorrindo, sorrindo, sorrindo.... sem nada entender.




Copirraiti 2010Dez

Véio China©

8 de out. de 2010

Grand Ópera verídica.

Se a mezzo-soprano
te soprasse uma promessa
descuidada e apressada:

Vivaldi nos auto-falantes...
Mozart, rock., tecno-funk...
se a mezzo-soprano
sussurrasse:
...Inquieto esse desejo!

e te desse esse beijo
transformasse tesão
em fato ,
em ato
num canto qualquer...
será que te esqueceria?
será que seria mais fácil?

Fetiche,
Lapso,
Regente,
Saxofone e harmonia

o coro canta
cuidado!
e ela sussurra:
que se dane!

se a mezzo-soprano
descuidada e apressada:
tropeçasse no ar

vivaldi soando
funk, punk
e o tombo
sonoro
retumbante

Braços abertos
Como asas, planícies,
Balé, vida e a voz ressonante que
Insiste e
Incide...

Se ela sussurrasse:
e te desse esse beijo
transformasse tesão
em fato, em ato.
num canto qualquer
mozart,
rock... electronic music
colapso.
Inquieto esse desejo!

o coro canta
cuidado!
e ela sussurra:
que se dane!

Na noite mal cuidada
de vodka,
vivaldi, lago dos cisnes,
nona sinfonia

Ele, moreno,
Contratenor, Dj, hinduísta.

Com ela, a mezzo-soprano
num drama musical;
Grand Ópera verídica
de uma vida insone.

o coro canta
cuidado!
e ela sussurra:
que se dane!

*


(Rosa Cardoso e Jessiely Soares)
*

24 de set. de 2010

Hild Hilst : Dez chamamentos ao amigo [completo]

I



Se te pareço noturna e imperfeita
Olha-me de novo.
Porque esta noite
Olhei-me a mim, como se tu me olhasses.
E era como se a água
Desejasse
Escapar de sua casa que é o rio
E deslizando apenas, nem tocar a margem.
Te olhei. E há um tempo
Entendo que sou terra. Há tanto tempo
Espero
Que o teu corpo de água mais fraterno
Se estenda sobre o meu. Pastor e nauta
Olha-me de novo. Com menos altivez.
E mais atento.

II

Ama-me. É tempo ainda. Interroga-me.
E eu te direi que o nosso tempo é agora.
Esplêndida altivez, vasta ventura
Porque é mais vasto o sonho que elabora
Há tanto tempo sua própria tessitura.
Ama-me. Embora eu te pareça
Demasiado intensa. E de aspereza.
E transitória se tu me repensas.

III

Se refazer o tempo, a mim, me fosse dado
Faria do meu rosto de parábola
Rede de mel, ofício de magia
E naquela encantada livraria
Onde os raros amigos me sorriam
Onde a meus olhos eras torre e trigo
Meu todo corajoso de Poesia
Te tomava. Aventurança, amigo,
Tão extremada e larga
E amavio contente o amor teria sido.


IV

Minha medida? Amor.
E tua boca na minha
Imerecida.
Minha vergonha? O verso
Ardente. E o meu rosto
Reverso de quem sonha.Meu chamamento?
Sagitário
Ao meu lado
Enlaçado ao Touro.Minha riqueza? Procura
Obstinada, tua presença
Em tudo: julho, agosto
Zodíaco antevisto, página
Ilustrada de revista
Editorial, jornal
Teia cindida.Em cada canto da Casa
Evidência veemente
Do teu rosto.

V


Nós dois passamos. E os amigos
E toda minha seiva, meu suplício
De jamais te ver, teu desamor também
Há de passar. Sou apenas poeta
E tu, lúcido, fazedor da palavra,Inconsentido, nítido
Nós dois passamos porque assim é sempre.
E singular e raro este tempo inventivo
Circundando a palavra. Trevo escuro
Desmemoriado, coincidido e ardente
No meu tempo de vida tão maduro.

VI


Foi Julho sim. E nunca mais esqueço.
O ouro em mim, a palavra
Irisada na minha boca
A urgência de me dizer em amor
Tatuada de memória e confidência.
Setembro em enorme silêncio
Distancia meu rosto. Te pergunto:
De Julho em mim ainda te lembras?
Disseram-me os amigos que Saturno
Se refaz este ano. E é tigre
E é verdugo. E que os amantes
Pensativos, glaciais
Ficarão surdos ao canto comovido.
E em sendo assim, amor,
De que me adianta a mim, te dizer mais?



VII



Sorrio quando penso
Em que lugar da sala
Guardarás o meu verso.
Distanciado
Dos teus livros políticos?
Na primeira gaveta
Mais próxima à janela?
Tu sorris quando lês
Ou te cansas de ver
Tamanha perdição
Amorável centelha
No meu rosto maduro?
E te pareço bela
Ou apenas te pareço
Mais poeta talvez
E menos séria?
O que pensa o homem
Do poeta? Que não há verdade
Na minha embriaguez
E que me preferes
Amiga mais pacífica
E menos aventura?
Que é de todo impossível
Guardar na tua sala
Vestígio passional
Da minha linguagem?
Eu te pareço louca?
Eu te pareço pura?
Eu te pareço moça?
Ou é mesmo verdade
Que nunca me soubeste?


VIII



De luas, desatino e aguaceiro
Todas as noites que não foram tuas.
Amigos e meninos de ternura
Intocado meu rosto-pensamento
Intocado meu corpo e tão mais triste
Sempre à procura do teu corpo exato.
Livra-me de ti. Que eu reconstrua
Meus pequenos amores. A ciência
De me deixar amar
Sem amargura. E que me dêem
Enorme incoerência
De desamar, amando. E te lembrando
- Fazedor de desgosto -
Que eu te esqueça.



IX


Esse poeta em mim sempre morrendo
Se tenta repetir salmodiado:
Como te conhecer, arquiteto do tempo
Como saber de mim, sem te saber?
Algidez do teu gesto, minha cegueira
E o casto incendiado momento
Se ao teu lado me vejo. As tardes
Fiandeiras, as tardes que eu amava,
Matéria de solidão, íntimas, claras
Sofrem a sonolência de umas águas
Como se um barco recusasse sempre
A liquidez. Minhas tardes dilatadas
Sobreexistindo apenas
Porque à noite retomo minha verdade:
teu contorno, teu rosto álgido sim
E por isso, quem sabe, tão amado.



X



Não é apenas um vago, modulado sentimento
O que me faz cantar enormemente
A memória de nós. É mais. É como um sopro
De fogo, é fraterno e leal, é ardoroso
É como se a despedida se fizesse o gozo
De saber
Que há no teu todo e no meu, um espaço
Oloroso, onde não vive o adeus.
Não é apenas vaidade de querer
Que aos cinqüentaTua alma e teu corpo se enterneçam
Da graça, da justeza do poema. É mais.
E por isso perdoa todo esse amor de mim
E me perdoa de ti a indiferença.

29 de ago. de 2010

Conexão




Ouviu nitidamente o chamado. Era intenso e persistente, feito de imagens dela mesma, vindas da cabeça dele. Imagens misturadas ao seu nome, às coisas que havia dito. Aquilo durou toda a noite, não conseguia fugir do incessante fluxo que a conectava ao desespero do outro. Ela não entendia porque ele lhe enviava esses recados mentais. Pensou que talvez ele nem percebesse o que fazia e ela recebia apenas por ter aquele maldito dom.

Afastou as imagens com gestos aborrecidos e tentou encerrar a conexão ergulhando no trabalho. Funcionou, ao menos por algum tempo.

Na hora de dormir as imagens voltaram, somadas agora a uma sensação de urgência, como se ele precisasse de ajuda e pensasse nela para fugir do desespero.

Disse a si mesma, repetidas vezes que aquilo era bobagem, tentou ignorar o chamado o que serviu apenas para torná-lo mais forte, por fim, enquanto se dizia tola por acreditar em tais bobagens a dúvida aconteceu. Insidiosamente um imenso “E SE...” formou-se e ela pegou o telefone discou o número dele,aquele que raramente usava e quando ele atendeu,percebeu no tom de voz que o chamado era real.

▬ Alô... Alô?

Ela não respondeu, nem mesmo quando ele disse seu nome. Sentiu-se tola por ligar. A ligação estava perfeita, nenhum chiado, nenhuma estática. Ouviram o silêncio um do outro por algum tempo, cerca de um minuto, depois ela desligou. Ele continuou a enviar as imagens, ela olhou para o rosto machucado e tentou ocupar-se, afastar os pensamentos daquela conexão.

4 de ago. de 2010

Febre



longas e sinuosas
cadeias de palavras
contraídas como febre
atreladas a mim
um jeito de quem dorme
e nunca se deita
nunca se vira
assim

esmerada prisão
da qual me liberto
molemente
brandamente
e umas quimeras
primas-irmãs
da tua prisão
tempo... tempo
razão.


tanto tempo
suspensa
perdi o rumo
o fio da meada
as meias
e, descalça
sinto o chão
hesitantes
meus medos vagueiam
naquelas rotas trilhas
cujas horas vadias
se preenchem com você


e essa maldita comoção
tua mão em minha testa
as palavras sussurradas.

faible febre fieber fever

não me deixe aqui
perdida
apartado
nessa loucura...
pois bem sabes
que a vida é dura
e que não dura muito

faz teu encanto
eu te escondo
guardado
protegido
encantado
menino mal criado
um traquinas
adocicado

digo ao vento
num sussurro
pra te proteger
digo a lua
num afago amoroso
que te conte
meu afeto não muda
pois sou muda
no que tento dizer
para ti, para outrem
o que nada falo
por não poder

23 de jul. de 2010

ciclotimia


teu sorriso
c.i.c.l.o.t.i.m.i.a
tua lágrima
c.i.c.l.o.t.i.m.i.a
tudo em você me afeta
c.i.c.l.o.t.i.m.i.a
teus h umores
ditam os meus
c.i.c.l.o.t.i.m.i.a
Teu humor oscilante
ponto de encontro e abandono
de um equilíbrio frouxo
c.i.c.l.o.t.i.m.i.a

29 de jun. de 2010

Enquanto espero!

de iriene borges e rosa cardoso


.

Um não sei que de procela
soprou-me na boca do nada
e despenquei até fincar raízes
numa nesga de madrugada

Viajo nos reflexos da sarjeta
Musgo e violeta no assento detrás
Um bilhete e Silêncio no alforje
Trinam apenas estampas florais

Hortência no guichê número dois
sacou meu destino da impressora
Paredes e divisórias acinzentam
o viés lilás eleito para a aurora

Desarvoram meus cabelos
palavras de céu e ventania
soprando versos descaminhos
enquanto espero calmarias

Sonho com a caixa em que te guardo

Encanto

Revolto em pedraria



.

23 de mar. de 2010

Vento. Litoral. Verdades e areia.




Vento. Litoral. Verdades e areia.-Poema de Eduardo Perrone- Ouvindo Legião -


Decodifiquei-te, hoje.
E descobri
O quanto de verdade
Sempre houve naquilo tudo.
Havia -sim- corpo desnudo,
E havia -também- duvida inconcebível.
Havia pitadas de mentira
E uma certa dose
De esperança
Descompromissada.


Será que minto, quando digo:
-Foste ( e és) por mim amada...?
Te digo logo que não.
Desgraçadamente ultrapassaste a seara do mero tesão,
E ergui pirâmides de vidro
Para te ter eterna.
Minha musa tem bem mais
Do que braços e pernas.
Tem o cheiro de flores suaves
E os pelos de fera selvagem.


E tem mais!
Tem as miragens verdadeiras
De toda a mentira do mundo!
Um colo benquisto,
Onde, este vagabundo, sonhou em dormir.
Tem a voz da menina com quem quis dividir
Toda a loucura
Que coubesse,
Num ato obsceno,
Ou , quiçá, numa prece...


Sabe , moça...
Sinto, de verdade, a tua falta.
E aqui, da cidade alta,
Tento te enxergar em cada puta,
Tento te enxergar em cada monja,
Tento te enxergar em cada lugar
Onde pulse algo de vivo.
Onde , mesmo nesses abismos,
Possa haver sinais
Que me mostrem você.


E, aonde estais “(..)além daqui dentro de mim”? ...


Talvez estejas na dicotomia entre verdades e mentiras,
Entre estas, onde havia um nexo causal
Ligando bosques, baias e litoral,
Ligando desejos, beijos e murros.
Transpassando realidades e muros,
Onde em cada passo dado a frente,
Existiu um outro bem diferente
Levando-nos
Ao ponto
De partida.


Não minto quando te digo querida,
Tampouco quando te via perdida,
Entre o que dizias
E o que demonstravas...
Sei que havia travas!
E que tudo, em resumo, era verdade...
Essa mesma que ainda me arde
Hoje, ainda.
Vê-la assim tão linda, eclipsada a céu aberto,
E tão distante,embora finda, bem aqui perto.

“(...)Agimos certo sem querer
Foi só o tempo que errou
Vai ser difícil sem você
Porque você esta comigo
O tempo todo
E quando vejo o mar
Existe algo que diz
Que a vida continua..."

7 de fev. de 2010

djinn



nasci ontem,
sob teu olhar

no céu pastavam
nuvens perfeitas,
– ovelhas –
num campo azul

teu sonho
tecido em desvario
fortuita essência
sua djinn perdida

presa e resumida
a um trivial
signo de caos,
marcado na tua pele.

sou assim,
um cadinho de confusão
que nada revoga.


5 de fev. de 2010

AURA RARA



.


quer que eu defina

agora, nessa hora

as cores dessa aura rara




que afine a sintonia

para além da tara





que defina alvos

compactue,repare

conserte, restitua




não sei

em algum lugar

alguém talvez defina

alguém ame melhor



e você continua por aí

dançando pelos multiversos



caçando rima

encantado,

raro e perplexo


(rosa cardoso)





Imagem :Angelica_Rivera_Aura_oleotela_50_x_40_2005

1 de fev. de 2010

vagamente



Vagamente atenta,
a lua me olha,
lentamente,
meus pensamentos
vagam,
devagar ...
até você.




(rosa cardoso)